28 de dezembro de 2011




Bhagavan Ramana Mararshi


A Luz e a Testemunha de Tudo

Pergunta: Os métodos Karma marga (o caminho da ação) e Jnana marga (o caminho do conhecimento) são separados e independentes um do outro? Ou o Karma marga é apenas preliminar e após ter sido praticado com êxito deve ser seguido pelo Jnana marga para a consumação do objetivo? O Karma defende o não apego à ação e ainda assim continuando a manter uma vida ativa, enquanto é dito que o Jnana significa renúncia. Qual é o verdadeiro significado de renúncia? A subjugação das paixões, da luxúria, da ganância, etc., é comum a todos e constitui a etapa preliminar essencial a qualquer caminho. A liberdade das paixões não indica renúncia? Ou a renúncia é diferente, significando a cessação da vida ativa? Essas questões estão me incomodando e rogo que luz seja lançada sobre essas dúvidas.
Bhagavan (sorrindo disse): Você já disse tudo. Sua pergunta também contém a resposta. A liberdade das paixões é o requisito essencial. Quando isso é alcançado tudo mais é alcançado.
P: Sri Shankaracharya enfatiza o Jnana marga e diz que a renúncia é preliminar a ele. Mas claramente há dois métodos mencionados no Gita. Eles são Karma e Jnana (Lokesmin dwividha nishtha...).
B: Sri Acharya comentou sobre o Gita e sobre essa passagem também.
P: O Gita parece salientar o Karma, pois Arjuna é convencido a lutar; o próprio Sri Krishna define o exemplo através de uma vida ativa de grandes explorações.
B: O Gita começa dizendo que você não é o corpo.
P: Qual é o significado disso?
B: Que devemos agir sem pensarmos que somos o ator. As ações prosseguirão a despeito de seu estado de ausência do sentido de ego. As pessoas adentram na manifestação por um propósito determinado. Esse propósito será cumprido esteja ela se considerando o ator ou não.
P: O que é Karma yoga? É o não apego ao Karma ou ao seu fruto?
B: Karma yoga é aquele yoga em que a pessoa não arroga a si mesma a função de ser o ator. As ações dão-se automaticamente.
P: É o não apego aos frutos das ações?
B: A questão surgirá apenas se houver o ator (o ego). O tempo todo tem sido dito que você não deve considerar-se o ator.
P: Então Karma yoga é kartrtva buddhi rahita karma - ação sem sentido de ser o agente.
B: Sim. Isso mesmo.
P: O Gita ensina vida ativa do começo ao fim.
B: Sim, a ação sem o ator.
P: É necessário, então, abandonar nossa casa e levar uma vida de renúncia?
B: A casa está em você? Ou você está em casa?
P: Está na minha mente.
B: Sendo assim, o que se passará com você quando você deixar o ambiente físico?
P: Agora eu vejo. Renúncia é apenas a ação sem a sensação de ser o agente. Não há ação para um jivanmukta (para uma alma liberada)?
B: Quem levanta a questão? É um jivanmukta ou outra pessoa?
P: Não é um jivanmukta.
B: Deixe a questão ser levantada após a libertação espiritual (jivanmukti) seja adquirida se isso for necessário. Mukti (a liberação) é admitido ser também a liberdade das atividades mentais. Pode um mukta pensar em ação?
P: Mesmo se ele abandona a ação, a ação não vai abandonar-lhe. Não é assim?
B: Com o que ele está identificado a fim de que esta questão possa se aplicar?
P: Sim, vejo tudo corretamente agora. Minhas dúvidas foram esclarecidas.
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P: Como conseguirei vencer minhas paixões?
B: Localize a raiz delas e então será fácil. Quais são as paixões? Kama (luxúria), krodha (raiva), etc. Por que elas surgem? Por causa da atração e da repulsão pelos objetos vistos. Como os objetos projetam-se na sua visão? Por causa de sua ignorância. Ignorância do que? Do Ser. Assim, se você encontrar o Ser e habitar nele não haverá nenhuma dificuldade proveniente das paixões.
Novamente, qual é a causa das paixões? O desejo de ser feliz ou de desfrutar do prazer. Por que o desejo por felicidade surge? Porque a sua natureza é ela mesma a felicidade e é natural que você vá para o que é seu. Essa felicidade não é encontrada em lugar algum além do Ser. Não procure-a em outros lugares, mas busque o Ser e resida nele. Ainda mais uma vez, essa felicidade que é natural é simplesmente redescoberta, portanto, ela não pode ser perdida. Enquanto que a felicidade decorrente dos outros objetos é externa e, portanto, suscetível de ser perdida. Por conseguinte, ela não pode ser permanente e por isso não vale a pena ser perseguida.
Além disso, a ânsia pelos prazeres não deveria ser incentivada. Não podemos extinguir o fogo vertendo gasolina sobre ele. Uma tentativa de satisfazer os seus desejos por aquele momento para que a paixão possa ser suprimida mais tarde é simplesmente tolice. Sem dúvida, existem outros métodos para a supressão das paixões. Eles são: (1) a regulação alimentar, (2) o jejum, (3) a prática de yoga, (4) alguns medicamentos. Mas seus efeitos são transitórios. As paixões reaparecem com maior vigor assim que o controle é removido. A única maneira de superá-las é erradicá-las. Isso é feito ao encontrarmos sua fonte, como indicado acima.

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P: Com cada pensamento o sujeito e o objeto aparecem e desaparecem. O 'eu' não desaparece quando o sujeito desaparece assim? Se é assim, como pode a busca pelo 'eu' proceder?
B: O sujeito (o conhecedor) é apenas uma modulação da mente. Embora a modulação (vritti) passe, a realidade por trás dela não cessa. O plano de fundo da modulação é o 'Eu' no qual as modulações da mente emergem e submergem.
P: Depois que as escrituras descrevem o Ser como srota (o ouvinte), manta (o pensador), vijnata ( o conhecedor), etc., ele é novamente descrito como asrota, amanta, avijnata, ou seja, não-ouvinte, não-pensador, não-conhecedor, É assim?
B: Justamente assim. O homem comum fica consciente de si mesmo apenas quando as modificações surgem no intelecto (vijnanamaya kosa); essas modificações são transitórias, elas surgem e desaparecem. Portanto, o ijnanamaya (intelecto) é chamado de kosa ou invólucro. Quando sobra apenas a pura consciência, ela é o próprio Chit (Ser) ou o Supremo. Estar em nosso estado natural com o apaziguamento dos pensamentos é em si felicidade e graça. Se essa felicidade é transitória – se ela vem e vai - então esse é só o invólucro da felicidade (Anandamaya kosa), não o puro Ser. O que é necessário é fixar a atenção sobre o puro 'Eu' após o apaziguamento de todos os pensamentos e não perder a conexão com ele. Isso tem de ser descrito como um pensamento extremamente sutil; de outra forma não se pode falar disso de maneira nenhuma, uma vez que ele não é nada além do que o verdadeiro Ser. Quem há para falar dele? Para quem? E como?
Isso está bem explicado no Kaivalyam e no Viveka Chudamani*. Assim, embora no sono a consciência do Ser não é perdida, a ignorância do jiva (ego) não é afetada por isso. Para essa ignorância ser destruída, esse estado sutil da mente (vrittijnanam) é necessário; na luz do sol o algodão não queima, mas se o algodão for colocado sob uma lente, ele pega fogo e é consumido pelos raios do sol que passam através da lente. Da mesma forma, embora a consciência do Ser esteja presente em todos os momentos, ela não é hostil à ignorância. Se através da meditação o estado sutil do pensamento é obtido, a ignorância é destruída. Também no Viveka Chudamani está escrito: sukshmam paramatma tattvam na sthoola drishtya (o extremamente sutil Ser Supremo não pode ser visto pelo olho grosseiro) e esha jyotirasesha sakshi (este é o Ser - a luz e a testemunha de tudo). Esse estado mental sutil não é uma modificação da mente chamada de vritti. Porque os estados mentais são de dois tipos. Um é o estado natural e o outro é uma transformação nas formas dos objetos. O primeiro é a Verdade e o outro é de acordo com o agente (kartrutantra). Quando esse último morre, Djallé kataka renuvat (como pasta de amendoim dissolvida em água) o primeiro permanecerá. O meio para alcançar esse fim é a meditação. Embora ela seja iniciada com a tríade da distinção (o meditador, o objeto meditado e o processo de meditação), finalmente terminará na consciência pura (jnanam). A meditação precisa de esforço, já o jnanam é sem esforço. A meditação pode ser praticada ou não praticada ou pode ser mal feita, jnanam não é assim. A meditação é descrita como kartru-tantra (como sendo própria do meditador), jnanam é descrito como vastutantra (do próprio Supremo).
P: O que significa o Atma?
B: O Ser.
P: Não é o amor por alguma coisa?
B: O desejo por felicidade (sukha prema) é uma prova da felicidade sempre presente do Ser. Caso contrário como poderia esse desejo surgir em você? Se a dor de cabeça fosse natural para os seres humanos ninguém tentaria se livrar dela. Mas toda a pessoa que tem uma dor de cabeça tenta se livrar dela, porque ela conheceu o tempo quando ela tinha nenhuma dor de cabeça. Ela deseja apenas o que é natural a ela. Assim também as pessoas desejam a felicidade porque a felicidade é natural para elas. Sendo natural, ela não é adquirida. As tentativas do homem só podem ser para se livrar da miséria. Se isso for feito o a felicidade e bem-aventurança sempre presentes serão sentidas. A felicidade primordial é obscurecida pelo não-ser que é sinônimo de não-felicidade ou miséria. Duhkha nasam = Suree prapti (a perda da infelicidade resulta no ganho da felicidade). Felicidade misturada com miséria é apenas miséria. Quando a miséria é eliminada, a felicidade sempre presente é dito ser adquirida. O prazer que termina em dor é miséria. As pessoas devem evitar tal prazer.
Os prazeres são de três tipos: priya, moda e pra-moda. Quando um objeto desejado está próximo à mão surge priya, quando se toma posse desse objeto surge moda, quando ele está sendo apreciado prevalece o pra-moda. A razão para o caráter prazeiroso desses estados é que um pensamento exclui todos os outros e então este único pensamento também se funde com o Ser. Esses estados são apreciados somente no Anandamaya Kosa (no invólucro da felicidade). Como regra, o Vijnanamaya kosa (o invólucro do intelecto) prevalece no estado desperto. No sono profundo todos os pensamentos desaparecem e o estado de obscurecimento é um estado de bem-aventurança, ali o corpo que prevalece é o Anandamaya. Esses são os invólucros e não o cerne que é interior a todos esses. Ele está além da vigília, do sono com sonhos e do sono profundo. Ele é a Realidade e consiste na verdadeira felicidade.
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